Dialética: lógica da contrariedade ou lógica da contradição

Na nota Verdade como perda do objeto, enquanto “em si” fixo e imutável, antes publicada neste blog, mostrou-se como a dialética de Hegel apreende o movimento de deslocamento no espaço e no tempo. O exemplo tem um caráter didático. De qualquer modo, dois pontos foram enfatizados: um deles expositivo e o outro ontológico.

Primeiro, para a razão dialética, o móvel passa pelos pontos de sua trajetória de tal modo que, para apreender o seu movimento, é preciso dizer que ele “está-agora/não-está-agora”, “está-agora/não-está-agora”, “está-agora/não-está-agora” e assim sucessivamente. Considerando, também, as determinações “posição” e “pressuposição” do móvel que passa.

Segundo, para essa compreensão de mundo, o próprio móvel não permanece idêntico a si mesmo conforme percorre o seu caminho. Não só, porém, porque as suas coordenadas de tempo e espaço mudam, mas porque a mudança de si mesmo é a condição de sua existência. Eis que a própria ideia de que ele permanece o mesmo em sua trajetória é já metafísica. E essa metafísica – note-se bem – é inerente e mesmo necessária ao pensamento comum e ao pensamento mecanicista.

Agora chegou o momento de discutir um pouco dois modos de pensar a dialética: trata-se de uma lógica da contrariedade ou da contradição? Para proporcionar esse esclarecimento de um modo didático, vale-se aqui de considerações de Vladimir Safatle em seu livro Dar corpo ao impossível – O sentido da dialética a partir de Adorno (Autêntica, 2019). Aí, entre outros objetivos, esse autor busca contestar a crítica central à dialética hegeliana feita por Gilles Deleuze (assim como, também, por outros filósofos).

O texto completo se encontra aqui: Lógica da contrariedade ou lógica da contradição?

Verdade como perda do objeto, enquanto “em si” fixo e imutável

Atualizado em 21/01/2021

Slavoj Zizek numa seção do primeiro capítulo de O mais sublime dos histéricos (Zahar, 1991), apresenta a leitura de Hegel dos famosos paradoxos de Zenão de Eléia. São quatro, mas, para a finalidade desta nota, só um deles é necessário: aliás, o mais famoso deles, que é conhecido como a corrida na qual o atleta Aquiles tenta alcançar a molenga tartaruga, que partira a sua frente porque lhe fora dada uma boa vantagem.

Eis como essa prova pode ser descrita brevemente:

Como se sabe, Zenão, filósofo da Grécia antiga, apresentou uma aporia para mostrar que o movimento não existe, que ele é ilusão. Numa corrida de 2 mil metros entre Aquiles e a tartaruga é dada uma vantagem de mil metros para a tartaruga. Dada a partida, assim que Aquiles tenha andado mil metros, a tartaruga, suponha-se, andou quinhentos metros; ela está, portanto, à frente de Aquiles. Quando Aquiles andou mais quinhentos metros, a tartaruga andou mais duzentos e cinquenta metros, continuando à sua frente. E assim por diante. A reiteração desse argumento, mostra, na visão de Zenão, que Aquiles não alcança nunca a tartaruga.

O filósofo grego apresenta esse raciocínio visando mostrar que o movimento é apenas aparência – e não a verdadeira realidade. Para discutir a leitura de Hegel dessa aporia, Zizek apresenta primeiro, sumariamente, como a ótica kantiana compreende esse modo de pensar. Emprega, então, as categorias kantianas do “em si” e do “para nós” com essa finalidade. Para Kant, como se sabe, a coisa em si é incognoscível – mas isto, entretanto, não é verdade para Zenão. Eis que esse pensador considerava possível conhecer a coisa em si mesma.

Eis o texto em pdf: Verdade como perda do objeto enquanto “em si” fixo e imutável

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Crise estrutural

Como se sabe, “crise” é sempre uma interrupção repentina e violenta no curso normal da existência de livro-de-mezarosum sistema. Crise econômica capitalista, nesse sentido, é uma interrupção no andamento do processo de acumulação de capital. Como também se sabe, “estrutura” é a disposição das partes num todo, isto é, o arranjo dos componentes desse todo tal como é posto pelo plexo das relações que unem as partes na formação do todo. Nesse sentido, o sistema econômico do capital é formado pelas relações sociais capitalistas, em particular e de modo central, pela relação entre o capital e o trabalho assalariado. Ora, qual é então o significado do termo “crise estrutural” que tem sido usado por alguns críticos do capitalismo? Um grande impasse na reprodução contínua desse sistema de relações sociais? No artigo aqui postado, examina-se essa questão no plano conceitual e no plano empírico. O capitalismo, como sistema mundial agora plenamente desenvolvido, passa atualmente por uma crise estrutural? Em seu desenvolvimento histórico, ele enfrenta agora mais uma barreira que pode superar (para vir a criar também, mais à frente, barreiras ainda mais poderosas) ou está encontrando finalmente o seu limite histórico insuperável?

O texto encontra-se aqui: crise-estrutural-do-capitalismo

Método de “O Capital”

Imagem do MarxFinalmente, depois de muito procurar, o autor deste blog encontrou um texto muito importante de Marcos Lutz Müller sobre o método de Marx. Eis o que diz o seu primeiro parágrafo: “A progressiva perda de especificidade metodológica do conceito de dialética, paralela à generalização do seu uso e à sua ampliação semântica, desembocou, hoje, nas versões não ortodoxas ou humanistas do marxismo, numa comprometedora diluição teórica do conceito, reduzido, muitas vezes, a um adjetivo pleonástico que qualifica um substantivo inexistente, ou, no marxismo-leninismo convertido em visão de mundo, no seu alinhamento ideológico, que evita voluntariamente aquela diluição pela invocação dogmática das três leis de Engels, reabilitadas em 1956.” Para ajudar a difundi-lo, a partir de agora, este texto está também publicado aqui: Muller – Exposição e Método Dialético em Marx

Dialética negativa e luta de classes

Adorno para o blog

É sabido que a luta de classes está amplamente ausente na teoria crítica de Theodor Adorno. Entretanto, há autores que julgam necessário se apropriar de seu conceito de dialética negativa a fim de desenvolver um pensamento anticapitalista que se mostre historicamente mais eficaz no alvorecer do século XXI. Pois, consideram que ele permite fazer uma boa crítica da concepção leninista de revolução e de socialismo, para, assim, retomar o projeto de transformação da sociedade. Eis que isto, segundo eles, tornou-se imperativo após o colapso do socialismo centralista, o qual florescera e murchara na extinta União Soviética. O pensamento de Adorno, mantido inquietamente no interior da tradição de Hegel e Marx, segundo eles ainda, permite renovar o papel da dialética na constituição de um pensamento revolucionário, mesmo se ele se afastara da práxis transformadora enquanto produção teórica e crítica.

Como as teses desses autores precisam ser mais bem conhecidas nos círculos socialistas brasileiros, esse blog publica uma tradução livre de um importante artigo que as apresenta incisiva e polemicamente. O seu autor, Sergio Tischler Visquerra, é professor da Universidade Autônoma de Puebla. O escrito de sua lavra se chama Adorno: o cárcere conceitual do sujeito, o fetichismo político e a luta de classes. Como artigo de coletânea foi originalmente publicado, em 2007, no livro Negatividad y revolución – Theodor W. Adorno y la política,  organizado por John Holloway, Fernando Matamoros e Sergio Tischler, uma edição da revista  Herramienta e da Universidade Autônoma de Puebla.

Para obtê-lo, clique aqui:Adorno – O carcere conceitual do sujeito

 

Menos do que nada

Uma nota sobre o marxismo de Slavoj ŽižekIncêndio no Capitalismo

Nessa pequena nota, faz-se um comentário crítico sobre a tese de Slavoj Žižek a respeito do caráter do capitalismo contemporâneo. Segundo ele, este se transformou nas últimas décadas numa espécie de supercapitalismo. Pois, o capital financeiro tornou-se recentemente não só hegemônico, mas relativamente autônomo em relação ao capital industrial. Em decorrência dessa transformação, o capitalismo se tornou, segundo ele, um sistema agora dominado pelo reino do virtual e do fantasmático. Para sustentar essa tese, ele se apoia supostamente no idealismo absoluto de Hegel para “radicalizar” o materialista Marx. O comentário aqui adiantado sugere, ao contrário, que ele se afasta do autor de O Capital. Para ler a nota como um todo, clique aqui O marxismo cabeça de vento de Slavoj Zizek

Causa e Efeito

Causa e efeito? Ou causa-efeito?

Nessa nota de aula, pretende-se mostrar de um modo didático, primeiro, como a causalidade é concebida na dialética de Hegel para poder expor, depois, como a concepção de causalidade por ele sustentada é necessária para resolver paradoxos que aparecem nos processos dinâmicos não-lineares. Para cumprir essa tarefa, será preciso apresentar, de início, como o entendimento – ou seja, o pensamento que se guia pela lógica da identidade e nela se fia para enfrentar o mundo – trata a relação de causa e efeito. Para fazê-lo, diante de um conjunto de concepções que tem uma história e que, postas em paralelo, mantém diferenças importantes entre si, não restará outra alternativa do que escolher as mais significativas para apresentá-las tópica, sumária e seqüencialmente. Para tanto, discute-se brevemente as concepções de causalidade de Aristóteles e da ciência moderna antes de chegar às concepções de Hegel.

Para ler a nota de aula completa, ir a pasta Aulas e baixar a aula 6.

O todo e as partes

O todo e as partes: a questão da emergência.

O objetivo da presente nota de aula é fazer uma apresentação didática da relação entre o todo e as suas partes, tratando também da questão da emergência que lhe é inerente. Discutem-se três possibilidades: o todo é um agregado; o todo é uma composição; o todo é uma totalidade. Discute-se, também, a questão: donde provêm as propriedades do todo? O reducionismo diz que vêm simplesmente das propriedades das partes. A análise compositiva afirma que advêm das capacidades de interação das partes. E a dialética sustenta, contra a aparência em contrário, que elas provêm da própria organização interna das partes que entram na formação do todo. As partes com as suas características fornecem o suporte para a constituição do todo, mas a sua existência enquanto tal é explanada pelo próprio processo de produção ou de reprodução de sua estrutura de relações internas (base de sua organização).

O texto complexo encontra-se na pasta Aulas, sob o título O todo e as partes – A questão da emergência

Emergência da emergência

Emergência sob a luz da dialética

No artigo, procura-se, em primeiro lugar, distinguir a ciência clássica da teoria dos sistemas, tal como foi formulada por Bertalanffy. Como essa segunda concepção de ciência apreende o mundo como uma hierarquia de sistemas de complexidade crescente, ela põe o problema da emergência. Discutem-se, em seqüência, duas grandes orientações na compreensão desse problema: o emergentismo fraco e o emergentismo forte. Mostra-se, depois, que ambas essas orientações não deixam de chegar a impasses lógicos, os quais as levam a cair em problemas lógicos: contradições ou irracionalismos. Trabalhando os conceitos de totalidade e contradição reflexiva, indica-se na seção final como a dialética de Hegel e Marx veio superar aqueles impasses, estabelecendo a possibilidade e a necessidade de um modo de pensamento que enfrenta o devir – e as transformações qualitativas – racionalmente.   

O artigo completo se encontra na pasta Artigos: Baixar texto 22.

Ciência relacional

Reducionismo e dialética 

Na primeira seção deste artigo, busca-se apresentar a ciência moderna, que é reducionista, por meio de seus traços fundamentais. Nesse sentido, mostra-se com base em escritos de Ulanowicz que ela pode ser caracterizada por um conjunto de fundamentos, os quais se encontram relacionados entre si: fechamento causal, atomismo, reversibilidade, determinismo e leis universais. Em seqüência, discutem-se as fraquezas da ciência moderna com base na crítica de Hegel ao mecanicismo. Segundo esse autor, essa ciência é culminação do saber do entendimento que privilegia a identidade em face da contradição, o fenômeno em relação à essência, a forma em relação ao conteúdo, etc. Ela opera com categorias abstratas, particulares e formais, sem articulá-las num sistema coerente visando à totalidade. Na terceira parte, tendo por inspiração as idéias de Ulanowics – mas recorrendo a outras fontes e procurando levá-las a outro patamar –, busca-se mostrar quais seriam as principais características de uma ciência relacional. Em contraposição àquelas da ciência reducionista, arrolam-se as seguintes: abertura causal, negação do atomismo (mas também do organicismo), irreversibilidade temporal, leis tendenciais que envolvem necessidade e casualidade, assim como, finalmente, historicidade de todos os processos naturais.  

Leia o artigo completo na pasta Artigos. Baixar artigo 21