Se a gente quiser, o capitalismo acaba

Autor: Aaron Benanav[1]

Como seria uma economia socialista? As respostas a essa questão variam, mas a maioria delas envolve a noção de planejamento. Uma economia capitalista é organizada por meio da interação entre preços e mercado. Uma economia socialista, por contraste, seria “conscientemente regulada (…) de acordo com um plano estabelecido”, para tomar emprestada uma frase de Marx. Porém, como tal plano seria feito e implementado? Essa tem sido uma questão de debate acirrado entre socialistas por mais de um século.

Um dos campos do debate colocou particular ênfase nos computadores. Esses “socialistas digitais” enxergam os computadores como a chave para administrar uma economia planejada. Seu foco está nos algoritmos: eles querem projetar softwares que possam receber informações sobre as preferências do consumidor e as capacidades de produção industrial – como uma peneira gigantesca alimentando um moedor de dados – e determinar as alocações ótimas dos recursos.

Ao longo dos anos, ocorreram alguns experimentos seguindo essas linhas. Nos anos 1960, o matemático soviético Victor Glushkov propôs uma rede nacional de computadores para ajudar os planejadores a alocar os recursos. Com o auxílio do ciberneticista inglês Stafford Beer, a administração de Salvador Allende no Chile tentou algo similar nos anos 1970, chamado de Cybersyn. Nenhum dos projetos chegou muito longe. A ideia de Glushkov encontrou resistência das lideranças soviéticas, enquanto o golpe de Pinochet eliminou o Cybersyn antes dele estar completamente implementado. De qualquer modo, o sonho continua vivo.

Hoje obviamente o socialismo digital pode fazer muito mais. A internet possibilitaria canalizar grandes quantidades de informação de todas as partes do mundo para sistemas de planejamento, quase instantaneamente. Saltos gigantescos na capacidade de computação tornariam possível processar todos esses dados rapidamente. Enquanto isso, o aprendizado de máquina e outras formas de inteligência artificial poderiam vasculhá-los, para descobrir padrões emergentes e ajustar a alocação de recursos apropriadamente. Em A República Popular do Walmart (The People’s  Republic of Walmart), Leigh Phillips e Michal Rozworski argumentam que grandes empresas como Walmart e Amazon já usam essas ferramentas digitais para planejamento interno – e que agora elas precisam apenas ser adaptadas para uso socialista.

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Os “comuns” em questão

Em setembro de 2015, publicou-se neste blog uma postagem com o título A luta pelo comum.  Por meio livre-de-coriatdela, divulgou-se o artigo Propriedade, apropriação social e instituição do comum, de Pierre Dardot e Christian Laval. Esses dois autores, nesse texto, defendem que “o princípio do comum que emerge hoje dentro de todos os movimentos sociais (…) não se define mais em termos de propriedade”. Ele é, assim, apresentado como oposto da propriedade privada, sem ser posto, alternativamente, como propriedade pública. Na postagem que se está aqui fazendo, divulga-se uma tradução de entrevista que Benjamim Coriat deu à revista Contretemps. Nela, ele defende um conceito de “comum” distinto do anterior. De modo diferente, sustenta ele a tese de que os “comuns” são compatíveis com a economia de mercado, ainda que venham “superar a ideia de que a única forma valiosa de propriedade seja a exclusiva”. Nessa perspectiva – é bem evidente –, os “comuns” são pensados sim como uma forma alternativa de propriedade em relação à privada e à pública. De modo crucial, bem ao contrário, ela pode conviver com essas duas últimas. O que distingue, segundo Coriat, os “comuns” é forma de governança, isto é, a forma pela qual a apropriação do recurso instituído como “comum” de certa comunidade vem a ser socialmente regulada por ela mesma.

A entrevista se encontra aqui: nao-podemos-apreender-os-comuns-com-as-chaves-do-passado

Pesadelo resistente

O atual momento histórico não está marcado pela perspectiva do avanço e do progresso. Ao contrário, um pesadelo de regressão parece rondar o Brasil e mesmo o mundo como um todo. Para não assistir passivamente ao desenrolar dos fatos é preciso começar compreendendo o que está acontecendo na sociedade humana cada vez mais unificadaCe cauchemar qui n finit pas pela relação de capital. Com o propósito de fornecer um esclarecimento nesse sentido, foi publicado na França mais um livro de Pierre Dardot e Christian Laval: Este pesadelo que não termina – como o neoliberalismo derrota a democracia. Explicando os efeitos deletérios da racionalidade neoliberal, ele pode contribuir para que seja possível encontrar uma forma de resistir ativamente ao sombrio dos tempos presentes. Uma resenha desse texto político, escrito e publicado sob um sentimento de urgência, é aqui apresentada como uma indicação de leitura.

E essa resenha se encontra aqui: Este pesadelo que não termina

 

A luta pelo “comum”

Da regulação social democrática 

roda de conversaTentando repercutir a tese de que, na atual conjunta histórica, é preciso opor o “comum” à propriedade privada e, mesmo, à propriedade estatal, de que, ademais, é preciso opor a democracia dos iguais à dominância de classe e, mesmo, à democracia burguesa, procura-se desenvolver aqui uma crítica à regulação social democrática. Sustenta-se, em síntese, que ela se tornou, ao mesmo tempo, uma impossibilidade e um estorvo. A tese da defesa do “comum” vem de um texto de Pierre Dardot e Christian Laval que se encontra aqui: Propriedade, apropriação social e instituição do comum.  A tese crítica à regulação moderadora acima mencionada, por sua vez, encontra-se aqui:A regulação social democrática tornou-se anacrônica

Este post,  publicado em 18 de setembro, foi modificado em 20 de setembro de 2015.