Uma nova era feudal?

Walden Bello [1] – Counterpunch – 13 de novembro de 2025

Investidura de um cavaleiro (miniatura dos estatutos da Ordem do Nó, fundada em 1352 por Luís I de Nápoles) – imagem de domínio público

Desde que a Internet nasceu na década de 1990, e com ela as “big techs”, temos a sensação de que entramos numa nova era em termos de economia política global. Muitos tentaram apontar em que consiste essa transformação. Talvez aquela mais famosa entre esses pensadores críticos seja Shoshana Zuboff. Essa autora, como se sabe, afirmou num longo livro que estamos vivendo numa era de “capitalismo de vigilância”.

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Dialética e desconstrução enquanto críticas da metafísica

Eleutério F. S. Prado [1]

Para poder entender certas controvérsias contemporâneas é preciso compreender minimamente o que é ontologia, metafísica, dialética e desconstrução. Como esse objetivo se constrói aqui um texto usando outros que serão expressamente indicados. E isso já mostra que não se reivindica qualquer originalidade no que vem escrito em sequência. Na verdade, copia-se trechos de outros escritos.

Inicia-se com a conceituação de ontologia e metafísica encontrada num escrito de François Talbot [2]:

“A palavra “ontologia” não foi cunhada em grego, mas sim no latim dos escolásticos. Surgiu no início do século XVII e seu uso rapidamente se difundiu. É formada pelas raízes “ontos”, que significa “do ser” em grego, e “logos, que significa “palavra” ou “saber” também em grego. “Ontologia”, portanto, designa simplesmente “o saber do ser”, a ciência do que é. O termo, então, passou a ser tomado como sinônimo de “metafísica”.

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Sohn-Rethel: a mercadoria e a ciência moderna

Autor: Eleutério F. S.Prado[1]

Da síntese social

Sohn-Rethel – que se definia como marxista crítico – em seu Trabalho manual e intelectual: para a crítica da epistemologia ocidental (1978), agora traduzido para o português (2024), sustenta uma tese audaciosa. “O trabalho manual se ocupa das coisas, das quais a razão teórica considera apenas o ‘fenômeno’” (Sohn-Rethel, 2024. p. 41). A partir desse problema, ele busca descobrir a origem social e histórica do modo de pensar a natureza e a sociedade que se vale fortemente da linguagem da matemática. E ele a encontra, na contracorrente das idéias dominantes, nas abstrações inerentes à forma mercadoria.

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As ontologias dialéticas de Hegel e Marx

François Talbot

Parte I

O artigo [1] que você está prestes a ler gira em torno da transição da “ontologia do conhecimento” de Hegel para a “ontologia da práxis” de Marx.[2] No entanto, nem Hegel nem Marx usaram o termo “ontologia” para descrever suas respectivas perspectivas. Nomear os eixos fundamentais de suas filosofias dessa maneira reflete um certo viés, uma forma particular de compreender nossa própria situação no pensamento. A sua função é situar os dois autores dentro da tradição que herdaram e apreender suas filosofias em relação aos problemas que nós mesmos enfrentamos no campo do pensamento contemporâneo.

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O valor é substância em Marx?

Eleutério F. S. Prado[1]

Introdução

Em artigo anterior, O fim incontornável de uma teoria, [2] tentou-se responder a uma importante crítica de Marcos Barbosa de Oliveira posta em seu escrito Considerações sobre a economia da atenção.[3] Refletindo depois, achou-se que não se havia discutido de modo suficiente esse tema que se afigura crucial para bem compreender o primeiro capítulo de O capital e, assim, o livro como um todo.

O autor da crítica havia “acusado” Karl Marx de formular uma teoria do valor metafísica. “Marx inicia a sua obra” – escreveu ele – “com uma análise abstrata da mercadoria”. Ora,“não tenho simpatia pela teoria do valor trabalho, nem concordo com uma concepção de mercadoria que julgo essencialista”. A ideia fundamental de Marx, apanhada em Aristóteles, segundo ele, consistiria em apresentar o valor como um substrato do preço”. O valor afirma conclusivamente é apresentado em O capital como uma substância que teria a mesma natureza da “ousia” – o ser ou essência da coisa.

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Não-identidade e relativismo histórico

Autora: Susan Buck-Morss [1]

Estamos perto do cerne do argumento de Adorno; eis aqui um protótipo de sua abordagem em geral. É correto dizer que Adorno não tinha nenhum conceito de história no sentido de uma definição ontológica e positiva de seu significado filosófico. Em vez disso, tanto a história quanto a natureza, tomados como opostos dialéticos, eram para Adorno conceitos cognitivos, não muito diferentes das “ideias reguladoras” de Kant.

Ora, esses conceitos foram aplicados em seus escritos como ferramentas críticas para a desmitificação da realidade. Ao mesmo tempo, cada um deles forneceu uma crítica ao outro. A natureza forneceu a chave para expor a não-identidade entre o conceito de história (como uma ideia reguladora) e a realidade histórica, assim como a história forneceu a chave para desmitificar a natureza. 

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O fim incontornável de uma teoria

Autores: Jorge Nóvoa [1] e Eleutério F. S. Prado [2]

Uma ideia luminosa

Sim, parecia uma teoria inovadora quando surgiu no artigo Em busca de uma teoria do valor-atenção [3], o qual foi publicado não faz muito tempo na grande rede de informação e comunicação em que tudo parece morrer de modo bem rápido e, igualmente, durar para sempre; contudo, não demorou muito, para que essa teoria recebesse algumas críticas, as quais ofuscaram o seu brilho e empanaram a pretensão que a engendrara. [4] Isso pressionou o seu autor, Marcos Barbosa de Oliveira, a tentar esquecer que a formulara. E o fez num novo artigo que denominou Considerações sobre a economia da atenção.[5]

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História natural e natureza histórica

Autora: Susan Buck-Morss [1]

Adorno formulou sua concepção de história muito cedo; apresentou-a num discurso na Kantgesellschaft (Sociedade Kant), em julho de 1932, em Frankfurt. Como aconteceu com seu programa de filosofia de 1931, esse discurso nunca foi publicado por Adorno. Entretanto, manteve um significado duradouro em sua teoria, já que ele o incorporou ao seu argumento (e até mesmo o citou diretamente) em seu estudo de 1966, que ficou conhecido como Dialektik Negative (Dialética Negativa).

Embora a linguagem do documento mostre Adorno em sua forma mais obscura, isso não se constitui num obstáculo intransponível à compreensão, quanto se tem em conta os pontos que já foram esclarecidos. Na verdade, serve para ilustrar esses pontos por meio de um documento concreto.

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Gerar informação gera mais-valor?

Autor: Eleutério F. S. Prado [1]

Introdução

Uma escrita enigmática, às vezes, costuma medrar no campo lacaniano. Os psicanalistas que aí lavram apreciam aparecer como defensores do esclarecimento; contudo, não deixam de se expressar por meio de um discurso de difícil acesso, recheado às vezes com fórmulas herméticas.

Aqui se vai comentar um tópico específico de um escrito de Jorge Alemán que prima pelo esforço de ser acessível e claro nos limites do possível. Contrariando a tendência obscurantista aludida, combina psicanálise e sociologia marxista para pensar o advento das “novas extremas-direitas” no capitalismo contemporâneo.  Para começar, cita-se um trecho de uma seção de seu livro recém-publicado[2] que ele achou por bem denominar de “mais-valia informacional e democracia refém”:

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Crítica à filosofia de Heidegger

Niilismo do sujeito moderno [1]

Autor: Matthew McManus

Heidegger ocupa uma posição curiosa como pensador de extrema-direita. Como Nietzsche, ele é inegavelmente um filósofo brilhante. O trabalho de Heidegger teve uma influência verdadeiramente surpreendente na cultura intelectual mais ampla, inclusive em todo o espectro político. Autores tão diversos como Jacques Derrida, Jordan Peterson, Richard Rorty e Alexander Dugin o descreveram como uma influência formativa. Por outro lado, porém, ao contrário de Nietzsche. Heidegger aderiu o seu nome e prestígio ao partido político mais sinistro de todos os tempos.

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