Sociabilidade associal: Marx e Freud

Autor: Eleutério F. S. Prado [1]

Essa nota tem um caráter experimental. Faz-se aqui uma nova tentativa de encontrar um nexo entre as concepções de Karl Marx e Sigmund Freud, as quais são e não deixaram de ser heterogêneas entre si mesmas. E ela se segue à tentativa feita no artigo Capitalismo e pulsão de morte (2024). Sem pretender contrariá-lo, retoma-se a sua linha de pensamento e as suas teses principais. Ora, esse novo ensaio se tornou necessário face ao desafio encontrado na leitura de um artigo de Samo Tomšič que versa sobre o caráter antissocial da sociabilidade capitalista (2024).

Segundo Tomšič ambos esses autores investigam e expõem características centrais da sociedade moderna, mesmo se um deles enfoca essencialmente a sociabilidade da relação de capital e o outro a constituição da psique humana-social nessas condições históricas. Eis como ele apresenta o problema:

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A massa fascista e o “pequeno-grande homem”

Autor: Samir Gandesha[1]

Não pode haver dúvidas hoje de que, após um longo período de dormência, elementos autoritários e, às vezes, francamente fascistas retornaram à vida pública com força total. Voltaram não apenas por toda a Europa, Reino Unido e Estados Unidos, mas globalmente, mais notavelmente na Turquia, Índia e Brasil.

A imagem visualmente mais chocante de tal retorno são os centros de detenção de migrantes que se espalham pelo sul da Europa. Mais notórios, são os “acolhimentos” de crianças centro-americanas negligenciadas e aterrorizadas, supostamente sujeitas a abusos psíquicos e sexuais, nos campos de concentração na fronteira sul dos Estados Unidos com o México.

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O herói trágico e o desocultamento da alienação

Autor: Todd McGowan[1]

Resumo

O que separa o herói trágico antigo do moderno é a alienação. O contraste entre a obediência de Antígona a seu ancestral e o questionamento de Hamlet sobre a autoridade de seu pai morto deixa clara essa diferença. A alienação evidente na tragédia moderna fornece a base para a emancipação porque revela como a subjetividade pode não coincidir com as injunções postas por qualquer forma de autoridade social, mesmo aquela que desafia a ordem dominante.

Rompendo consigo mesmo

A emancipação só está presente no universo moderno. Trata-se de uma subjetividade que rompe com o domínio da autoridade da tradição sobre si mesma. Essa ruptura exige que o sujeito reconheça que não se enquadra na ordem social que habita.

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Marx e Polanyi juntos

Em virtude da onda populista de direita – Trump, Brexit etc. – que assola os países ditos desenvolvidos, alguns acreditam que o neoliberalismo está passando por um forte abalo. Não, não está. Na verdade, o que está perdendo a posição de pensamento político hegemônico é o neoliberalismo progressista cuja onda juntou tacitamente, a partir dos anos 1980, os defensores da liberalização dos mercados local e globalmente e os movimentos progressistas que se esmeraram na luta pela igualdade de gênero, sexo, etnia e religião.

Ora, o neoliberalismo progressista minou as suas próprias bases sociais e está sendo substituído atualmente pelo neoliberalismo conservador ou mesmo reacionário. Em vaga crescente, este neo-neoliberalismo figura como anti-globalista. Ele está conseguindo reunir os mesmos partidários da sociabilidade competitiva com as classes trabalhadoras revoltadas com um declínio econômico e social produzido pela redução sistemática da proteção social, assim como pela globalização, desindustrialização e financeirização das economias centrais. E essa aliança política tem sido mediada por um extremismo de direita que se caracteriza por propagar a misoginia, a xenofobia, o etnocentrismo etc.

Para compreender esse processo de mudança histórica parece bem importante tomar ciência das reflexões de Nancy Fraser, filósofa norte-americana que tem se destacado na análise do capitalismo contemporâneo. No texto que aqui se publica em português, ela defende a tese de que para entender bem o que está acontecendo é preciso desenvolver uma teoria crítica que combina e integra as “visões” de Karl Marx e Karl Polanyi sobre a sociedade moderna.

Para Fraser, o que se experimenta agora é uma crise multifacetada da civilização – não só ocidental; eis que essa crise se manifesta não apenas no interior do domínio econômico, mas também em suas relações contraditórias com a natureza humanizada, com a esfera da reprodução social e com o campo da política etc.  Tal compreensão macrossocial sugere, também, que essa reconfiguração do neoliberalismo vai acabar minando também as suas próprias bases de existência nos próximos anos.  

O texto, bem polêmico, encontra-se aqui: Por que dois Karls é melhor do que um