A fenomenologia de Tran Duc Thao

Título original: A origem e a gênese da consciência pura: o conteúdo real da fenomenologia por meio do materialismo dialético de Tran Duc Thao.[1]

Jérôme Melançon – Universidade de Regina, Canadá

Resumo

A leitura de Husserl por Tran Duc Thao visa desembaraçar a noção de consciência pura para redescobrir a realidade da vida humana. O marxismo, portanto, permitiu que Thao fosse além da fenomenologia para alcançar os objetivos do próprio marxismo. A partir do que ele retém do idealismo transcendental de Husserl, Thao desenvolve um materialismo dialético no qual a subjetividade é o movimento da própria tomada de autoconsciência da natureza.

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A desmedida de Marcos Dantas

Autor: Eleutério F. S. Prado [1]

“Tudo o que é humano – riqueza, honra, poder, mas também alegria, dor etc. – tem uma medida determinada, cuja transgressão leva à perdição e à ruina.” Hegel, G. W. F. – A ciência da lógica.[2]

Marcos Dantas escreve torto por linhas certas, ou melhor, por linhas aparentemente certas. Eis que em suas incursões na teoria do valor de Karl Marx, ao pôr em arquivo digital e no papel ideias que antes ruminara, ele comete alguns desatinos conceituais dignos de nota. A propósito, ele colou em um seu escrito uma citação de um texto vintenário – logo se dirá qual –, que julgou corroborar as suas teses.

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A economia dos EUA prosperará! – segundo Roubini

Como se sabe, Nouriel Roubini era conhecido como “doutor estouro” (doctor doom, em inglês) em razão de sua vocação para prever as crises vindouras do capitalismo; porém, agora passou a ser chamado de “doutor estrondo” (doctor boom, também em inglês), porque está prevendo um futuro muito promissor para a economia dos Estados Unidos da América do Norte, em razão das transformações tecnológicas em curso e de uma suposta excelência dos mercados.

 Curiosamente, o seu último livro Megathreats (abaixo referido), que versa sobre as mega-ameaças ao futuro da humanidade, justifica ainda o epiteto anterior. Mesmo duvidando do acerto dessa predição, publica-se aqui o seu último escrito para que possa ser eventualmente discutido pelos interessados. Veja-se também o escrito anterior que ia no mesmo sentido.

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A defesa da sociedade hierárquica

Autor: Matthew McManus [1] (Segunda Parte. A primeira parte está aqui)

Curiosamente, a direita política foi a segunda, não a primeira, doutrina importante a surgir na época moderna. Isso pode parecer estranho, já que os conservadores muitas vezes se consideram defensores de valores mais antigos e duradouros do que os liberais e, certamente também, do que os socialistas. E, de fato, a direita política geralmente se baseia em autores da antiguidade e o faz mais intensamente que que nos liberais ou socialistas, quer se trate de Aristóteles, Confúcio ou as inúmeras vertentes do quase-tomismo.

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O fogo em Los Angeles foi previsto

Los Angeles arde, o pensador marxista Mike Davis antecipou a tragédia. Mergulhando em arquivos obscuros, percorrendo as colinas secas e as habitações que são pasto para fogo em Los Angeles, Davis relatou e explicou a implacável combustibilidade física e social de Los Angeles com zelo e erudição. Textos de Harold Meyerson e Joshua Frank.

HAROLD MEYERSON E JOSHUA FRANK

Como foi prevista a tragédia ambiental?

The American Prospect, 8 de janeiro de 2025

É uma verdade quase universalmente negada que os incêndios apocalípticos que assolam Los Angeles – a minha cidade natal – não são mais do que uma versão ampliada do normal.

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Por que Trump venceu?

Autor: Eleutério F. S. Prado [1]

Os partidários norte-americanos da democracia liberal, com boa dose de angústia, têm se defrontado com essa pergunta. Se Trump se afigura para eles como populista, autoritário, mentiroso e até mesmo como neofascista, como pode ele ter ganho a eleição presidencial nos Estados Unidos, um suposto bastião da democracia liberal num mundo propenso a acolher ditaduras? Veja-se o que dizem dois economistas famosos, ganhadores do Prêmio Risk Bank (usualmente chamado de Prêmio Nobel de Economia), dado anualmente para os profissionais dessa área que propugnam pela continuidade do capitalismo.

Eis a explicação dada por Daron Acemoglu:

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A dissolução do marxismo humanista (II)

Autor: Ian H. Angus

Publica-se agora a segunda parte do artigo de Ian H. Angus. A primeira foi publicada e está aqui. Em sequência se publicará uma nota do autor deste blogue:

3. A dissolução do marxismo humanista

Sugeri que a filosofia dos anos sessenta deveria ser entendida como um espaço discursivo próprio e não como uma doutrina específica. Agora quero me concentrar em certos aspectos problemáticos do humanismo marxista, os quais provocaram reações e desenvolvimentos subsequentes que levaram à sua dissolução. Usando a terminologia em uso no discurso filosófico contemporâneo, esses desenvolvimentos constituíram o campo do “pós-estruturalismo”. Podem, assim, ser explicados com referência a várias obras altamente influentes de Michel Foucault e Jacques Derrida. Abrindo um parêntese, pode-se dizer o discurso anglófono foi assim marcado por uma mudança na referência primária já que se transladou da filosofia alemã para a francesa. E essa dissolução começou já no auge do humanismo marxista.

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A entropia requer o decrescimento

Autor: Crelis Rammel[1]

Introdução

Uma fera voraz devora o equivalente a um monte Everest inteiro de recursos a cada 20 meses. Também acelera o seu metabolismo, pois vai reduzir esse prazo para apenas 10 meses nas próximas duas décadas.[2] Ao encher a barriga, a fera esgota seu ambiente e o sobrecarrega com resíduos, interrompendo os sistemas naturais de renovação de recursos e gestão de resíduos. Em última análise, aniquila seu próprio habitat. Refiro-me, naturalmente, ao capitalismo global.

Esse sistema exige acumulação contínua de capital e vacila quando se vê prejudicado nesse processo. A resposta típica à crise ecológica não consiste, portanto, em restringir o crescimento econômico, mas em depositar toda a esperança na eficiência, circularidade, desmaterialização, descarbonização e outras inovações verdes orientadas para o lucro dentro do capitalismo.

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China: superprodução e guerra de preços

Autor: Romaric Godin[1]

Enquanto as famílias europeias continuam a enfrentar as graves consequências sociais da inflação, outra ameaça já se aproxima do outro lado do mundo: a deflação. [2] Na China, o principal problema não é mais o aumento dos preços, mas a queda dos preços. Em janeiro, os preços ao consumidor caíram 0,8%. É o quarto mês consecutivo de queda dos preços, sendo essa última aquela mais acentuada desde 2009.

Ainda mais preocupante é o fato de que os preços anuais da produção industrial chinesa estão caindo há onze meses. Em janeiro, caíram 3,4%. Esta situação é a consequência lógica do agravamento da situação econômica no país e, em particular, da crise imobiliária que começou no final de 2021. Note-se as dificuldades da incorporadora Evergrande, que foi colocada em liquidação em 28 de janeiro por um tribunal de Hong Kong.

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O poder de mercado é permanente

Mordecai Kurz [1] – Project Syndicate – 1/12/2023

E a concorrência não o elimina

O dinheiro gira e cresce

Economistas e formuladores de políticas concordam que as melhorias tecnológicas são cruciais para o crescimento econômico. A revolução da tecnologia da informação (TI) das últimas quatro décadas impulsionou a economia; por isso, muito poucas pessoas gostariam de pará-la. Mas desde a década de 1980, à medida que essa revolução se enraizou, a economia dos EUA experimentou um aumento acentuado no poder de mercado das empresas, definido predominantemente como sua capacidade de afetar os preços.

O aumento da produtividade e o aumento do poder de mercado são os resultados gêmeos do processo de inovação. Ambos resultam da propriedade privada da tecnologia e dos poderes legais conferidos por patentes ou segredos comerciais. Quando uma onda de inovação como a revolução da TI decola, o poder de mercado rapidamente se acumula e se torna uma força significativa, com profundas implicações econômicas e políticas. Em meu livro recente, chamo essa força única de “poder de mercado da tecnologia

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