Um futuro estagflacionário: por quê?

Autor: Eleutério F. S. Prado [1]

Nouriel Roubini é um singular economista do sistema. Se possui fama internacional, costuma ser olhado com irônica desconfiança. Eis que os seus pares o consideram como um “profeta da desgraça”.  No entanto, tudo o que diz tem enorme plausibilidade. Ele tem sustentado agora uma previsão nuviosa sobre a situação econômica nas próximas décadas do século XXI: o capitalismo em nível global sofrerá de estagflação renitente e essa será a sua condição normal doravante.  

Eis como Roubini, em seus próprios termos, apresenta essa antevisão:

Economias avançadas e mercados emergentes estão cada vez mais envolvidos em “guerras” necessárias. O futuro será estagflacionário e a única questão é quão ruim isso será. A inflação aumentou acentuadamente ao longo de 2022 nas economias avançadas e nos mercados emergentes. As tendências estruturais sugerem que o problema será secular – e não transitório.

Haverá, pois, guerras necessárias contra as novas pandemias, os efeitos do aquecimento global, as imigrações maciças, as pobrezas escandalosas etc.; haverá, inclusive, conflitos bélicos reais como o atual entre os Estados Unidos (atrás do palco), a Ucrânia e a Rússia (no próprio palco em que ocorrem efetivamente as batalhas). Como esses dois tipos de “guerras” atuarão seja para elevar a demanda agregada seja para contrair a oferta agregada, eles criarão as condições objetivas para a normalização do fenômeno “estagflação”. Os seus dois escritos em que essas “previsões” aparecem se encontram aqui e aqui.

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A inciência e a inflação

Jayati Ghosh lamenta a incapacidade da profissão de economista de pensar além de análises grosseiras da inflação – e de políticas grosseiras para contê-la. Mas donde vem essa inciência? Qual a sua condição estrutural?

Autora: Jayati Ghosh; publicado em Social Europe, 25/07/2022

A onda inflacionária tem revelado várias coisas sobre os governos atuais, mas também, de forma mais patente, sobre os economistas. O número de economistas e, consequentemente, de formuladores de políticas, que permanecem presos à ideia inflexível de que a inflação resulta de uma política monetária muito frouxa – e que, portanto, os bancos centrais devem restringir a oferta de dinheiro e aumentar as taxas de juros – é enorme. Trata-se de algo que John K. Galbraith teria chamado de “sabedoria convencional”.

Mas isso está errado. As causas da inflação variam de acordo com o contexto e o período. Uma política monetária mais rígida é uma ferramenta perigosa que corre o risco de gerar recessão e desemprego – prejudicando ainda mais os trabalhadores do que os próprios aumentos de preços. Mas essa política não causa apenas sofrimento humano, pois, se os motores da inflação forem outros, reduzir o excesso de demanda supostamente culposo não resolverá o problema.

Esses fatos óbvios parecem quase esquecidos na discussão convencional. Até o respeitado economista Olivier Blanchard, em uma série de tweets, sugeriu que o aumento do desemprego era a única maneira de controlar a inflação. O problema, aparentemente, era como fazer com que os trabalhadores entendessem e aceitassem isso:

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