Policrise novamente

Autor: Michael Roberts

The next recession blog – 08/10/2023

No início deste ano, escrevi um poste sobre o que alguns chamam de ‘policrise’. O termo indica que o modo de produção capitalista está se defrontando com diversas tensões disruptivas simultâneas: econômica (inflação e recessão); ambiental (clima e pandemia); e geopolítica (guerra e divisões internacionais). Tudo isso começou a acontecer já no início do século XXI.  Palavra da moda na esquerda conectada às novidades, resume, em muitos aspectos, a minha própria descrição das contradições do sistema. Aquilo que designei como “longa depressão” já da década de 2010 está agora atingindo o seu auge.

Como neste mês de outubro as principais agências econômicas internacionais, o FMI e o Banco Mundial, se reúnem em Marraquexe, vale a pena atualizar aquela postagem. É bom verificar o que está a acontecer com as contradições que compõem a policrise do capitalismo.

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A tripla desigualdade do problema climático “global”

Autor: Adam Tooze, 11/06/2023

A crise climática é frequentemente discutida como um problema global que requer a mobilização coletiva da humanidade. Isso pode ser inspirador. Contra o pano de fundo da tensa geopolítica de hoje, pode até ser reconfortante imaginar que existem pelo menos alguns problemas que temos em comum como “nós”. Conforme observado no Relatório de Desigualdade Climática 2023 , escrito pela equipe de Lucas Chancel, Philipp Bothe e Tancrède Voituriez, esta visão “global” do problema é profundamente enganosa.

A realidade do “problema climático global” é, de fato, definida por uma tripla desigualdade. O maior impacto é sofrido por aqueles que menos contribuíram para a crise e têm menos condições de pagar. Aqueles de nós que são mais responsáveis e têm maior capacidade de contribuir para a solução sofrem atualmente menos e serão ameaçados no futuro por um impacto relativamente menor.

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O decrescimento é, sim, necessidade imperiosa

Autor: Eleutério F S Prado [1]

Não há dúvida, o capitalismo é globalmente hegemônico. Em quase todos os países que conformam o mundo atual domina o modo de produção histórico que se orienta pela acumulação de capital. Em todos eles, por isso, o crescimento econômico figura como um imperativo socialmente cristalizado. Em consequência, a expansão da produção como riqueza efetiva e da riqueza fictícia na forma de dívidas empapeladas (ou digitalizadas) não pode ser desafiada de modo eficaz. O decrescimento, assim, aparece como uma má utopia.

No entanto, acumulam-se já nos sítios da internet e nas prateleiras das bibliotecas artigos e livros que defendem o decrescimento como uma necessidade imperiosa e mesmo definitiva para o caso de que a humanidade deseje sobreviver nas próximas décadas deste e do próximo século pelo menos. Como se sabe, a razão imediata do surgimento dessa ansiedade teórica – e mesmo prática – advém da preocupação crescente com as mudanças climática enquanto uma mega-ameaça à existência de vida altamente organizada na face da Terra.

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Mudança climática: culpa da humanidade?

Autor: Michael Roberts, blog The next recession, 12/08/2021

O sexto relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) tem quase 4.000 páginas. Os autores tentaram resumi-lo e o apresentaram como a “oportunidade final” para evitar a catástrofe climática. As suas conclusões não mudaram muito desde a publicação anterior, feita em 2013; desta vez, entretanto, elas foram mais incisivas.  

A evidência é clara: conhece-se a causa do aquecimento global – supostamente a humanidade; sabe-se que o planeta está se aquecendo (cerca de 1° grau até agora); sabe-se ainda que as concentrações de CO2 na atmosfera se elevaram desde os tempos pré-industriais, ou seja, aumentaram em 30%; tem-se conhecimento que o aquecimento mostrado até agora foi gerado historicamente pela poluição. É preciso voltar vários milhões de anos para ver algo semelhante ao que se tem hoje. Durante a era do Plioceno (ou seja, entre 5,3 e 2,6 milhões de anos atrás) o mundo tinha níveis de CO2 de 360-420 ppm; agora, esse valor se encontra aproximadamente em 415 ppm.[1] 

Em seu resumo feito para os formuladores de políticas do mundo em geral, o IPCC afirma claramente que a mudança climática e o aquecimento global são “inequivocamente causados ​​pelas atividades humanas”. Mas, pode a mudança climática ser colocada na conta de toda a humanidade – e não na conta daquela parte que possui, controla e decide sobre o que acontece com o nosso futuro? 

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