Michael Roberts – The next recession blog – 26/04/2021. Nota: na próxima segunda-feira publica-se um comentário extenso sobre as críticas de Roberts ao keynesianismo.
Tal como a economia marxista e a economia convencional, a economia keynesiana tem várias correntes. Há uma economia keynesiana que não escapa dos parâmetros da economia de equilíbrio geral. Nessa teoria, as variações nas receitas e nas despesas, no consumo e no investimento, nas taxas de juros e no emprego tenderão a um equilíbrio. A ele corresponderá um certo nível de emprego – e inflação –, sempre que não haja “choques exógenos” que afetem a estase dos mercados. Se os salários e as taxas de juros caírem o suficiente, o pleno emprego e o crescimento do investimento serão alcançados.
Mas este é o ramo que Joan Robinson, uma seguidora de Keynes, chamou de “keynesianismo bastardo”. Trata-se de uma corrente que elimina todas as características radicais da economia de Keynes, que, para Robinson, uma autora politicamente quase maoísta, presumia que o pleno emprego não poderia ser alcançado automaticamente nas modernas “economias de mercado”. É mais provável que prevaleça um equilíbrio de subemprego já que, segundo ela, isso se deve à incerteza sobre o futuro dos capitalistas na tomada de decisões de investimento e à irracionalidade dos “agentes” econômicos sejam eles consumidores ou investidores.
Essa visão radical da economia keynesiana veio a ser chamada de pós-keynesianismo (PK). Os principais proponentes dessa corrente foram contemporâneos de Keynes, como Robinson e Michal Kalecki (marxista e keynesiano), assim como, mais tarde, Hyman Minsky (socialista e keynesiano). Agora existe toda uma escola de economia pós-keynesiana, com revistas, conferências e centros de pensamento (think tanks).
A economia PK domina e influencia as visões e as políticas de esquerda nos movimentos trabalhistas nas principais economias (liderados por Corbyn, Sanders etc.). Trata-se da ala radical da gama de correntes da teoria econômica keynesiana em geral. Ela tem dominado o movimento trabalhista desde Keynes, com exceção do período após os anos 1980, quando as principais teorias neoliberais de “mercado livre” influenciaram, por algumas décadas, os líderes sindicais.
Neste blog, já foi gasta muita tinta explicando como a economia marxista difere da economia keynesiana em quase todos os aspectos. Para mim, uma abordagem marxista da teoria e da política explica melhor a natureza do capitalismo, assim como quais são as políticas corretas que o movimento operário deve adotar em sua luta contra o capital, mas também por uma sociedade melhor para todos. Na verdade, acho que a economia keynesiana tem sido um obstáculo, principalmente porque a sua análise do capitalismo está errada. Além disso, sua conclusão política é que o capitalismo pode ser reformado ou administrado de uma forma que funcione para todos com alguns ajustes políticos inteligentes.
A teoria PK, porque parece ser muito radical (quando reconhece que o capitalismo não pode ser facilmente administrado para o benefício de todos) e porque muitos de seus expoentes se consideram socialistas (ou mesmo marxistas), pode ser mesmo ainda mais enganosa. Eis que se baseia em uma visão radical do keynesianismo, quando o próprio Keynes não era tão radical quanto os seguidores de KP acreditam que ele era.
É preciso examinar, mais uma vez, as ideias básicas da economia pós-keynesiana.
Para isso, recorrerei a um artigo recentemente exposto em conferência por zoom, intitulado A Visão Pós-keynesiana do mundo em cinco princípios. Trata-se de uma palestra proferida por Alex Williams que pertence ao Levy Institute, no Berggruen Institute de Los Angeles, EUA.
Alex primeiro fala sobre a crescente popularidade do “pós–keynesianismo” após a crise financeira global e a crise do COVID. Alex reconhece que se tornou popular porque “os mercados financeiros adoram já que explica bem como a economia funciona; ora, isso é útil pois nesses mercados o salário depende da compreensão de como a economia funciona”.
Não tenho certeza se se trata mesmo de um bom motivo para os analistas financeiros “adorarem” o PK, aparentemente concordando com as suas teses. Mas Alex continua explicando que o PK “fornece uma boa heurística causal para entender o impacto dos fluxos financeiros na produção e na economia em geral. Ele também advoga em favor do realismo no que se refere aos impactos das políticas públicas nos resultados econômicos. A dívida pública e a dívida privada são coisas diferentes, ofertar dinheiro não causa inflação, a dívida privada precisa às vezes ser rolada, pois, se não o for, isso vai ter impactos reais”.
Portanto, de acordo com Alex, o PK explica melhor como funciona a economia moderna e porque a dívida (principalmente a dívida privada) é importante. Um ramo do PK, conhecida por Teoria Monetária Moderna (TMM), recentemente iluminou o funcionamento do dinheiro no capitalismo. Alex afirma que a “TMM surgiu originalmente da agenda de pesquisa pós-keynesiana; muito de seu modelo econômico subjacente ainda é muito pós-keynesiano em sua estrutura”. Creio, portanto, que minha crítica ao TMM também se aplica ao pós-keynesianismo.
Depois, Alex faz uma declaração bem mais interessante: “Em uma economia capitalista, a produção é feita para gerar lucro e não para produzir coisas usáveis. O valor aí gerado é geralmente medido usando a convenção social de contabilidade. A produção ocorre por meio de uma antecipação aos fluxos de dinheiro, tal como acontece com o investimento e o consumo. Deste ponto de vista, as coisas são avaliadas, mais ou menos, por seu valor contábil e os atores econômicos agem com base nesses valores contábeis. Ora, os pós-keynesianos pensam que isso representa um bom ponto de partida para a teorização econômica, o qual consiste em usar as próprias quantidades usadas pelos próprios atores.
O que significa isto? Alex adota um ponto básico que parece resultar da lei do valor de Marx: a saber, que a produção capitalista visa o lucro, não o valor de uso social. É preciso, ademais, medir os valores em termos monetários, como fazem os capitalistas. Isso parece promissor. Posto isso, Alex vai direto ao tema dos fluxos de dinheiro, investimento e consumo. Assim, o papel do lucro não é mais mencionado, mesmo depois que foi asseverado que a produção capitalista visa o lucro – e não o consumo e mesmo o investimento. Na minha opinião, isso é típico de apoiadores do PK. Bem depressa, eles dispensam o lucro de suas explicações teóricas – e isto será visto em sequência.
Tendo ocultado o papel dos lucros, Alex diz que, em vez disso, é preciso olhar para as economias modernas a partir de uma “visão baseada no balanço da economia como um todo. Os atores individuais têm ativos e passivos, receitas e despesas. O ativo de alguém é responsabilidade de outra pessoa e vice-versa. Tudo está inter-relacionado através do uso dessas convenções”.
Assim, é afastado o motor subjacente das economias capitalistas, a saber, o lucro, as flutuações do lucro, ou seja, o evolver da lucratividade para “estudar o fluxo de pagamentos e a acumulação de ativos, não a alocação de recursos escassos para seus fins mais eficientes. Um dos principais benefícios dessa abordagem é que ela descarta alguns resultados impossíveis: nem todos podem ter superávit comercial, se houver déficit comercial, o setor privado ou o setor público terão que ter déficit para financiá-lo”.
Portanto, vai-se assim logo para a consideração das identidades macroeconômicas ao analisar as economias reais, ou seja, fica-se no balanço receitas = despesas, déficits e superávits dos setores público e privado, balanço comercial etc. Mas nada se diz sobre o lucro ou a origem do lucro.
Alex nos diz que um princípio fundamental da PK é analisar as expectativas: “nosso próximo princípio é que tudo é expectativa”. “As expectativas informam as ações dos agentes e essas ações, por sua vez, criam realidade. Talvez o modelo mais simples do ciclo causal keynesiano seja dizer que a demanda esperada impulsiona o investimento, o investimento impulsiona o emprego, o emprego impulsiona os salários, os salários impulsionam o consumo, o consumo impulsiona a demanda e a demanda valida o investimento. A demanda esperada impulsiona os investimentos porque as empresas só investem em capacidade e na contratação de mais trabalhadores quando acham que mais pessoas vão querer comprar seu produto no futuro, mais do que têm feito no momento presente. Se esperassem a mesma demanda, ou menos, não haveria necessidade de investir. Eles poderiam continuar a usar o mesmo equipamento”.
Ora, agora foi dito o que importa. O investimento sob o capitalismo não é movido pelo lucro ou pela lucratividade, mas finalmente pelas “expectativas”. Não é movido nem mesmo pelo lucro futuro, mas sim “demanda esperada”. Isso impulsiona o investimento que, por sua vez, gera empregos e salários.
Mas, será esta última mesmo a sequência causal correta na produção e acumulação capitalistas? Em muitas postagens anteriores, destaquei as fórmulas que são chaves nas identidades macroeconômicas usadas pelos pós-keynesianos. Aqui estão elas de novo.
Renda Nacional = Despesa Nacional
Renda Nacional = Lucros + Salários
Despesa Nacional = Investimento + Consumo.
Portanto, lucros + salários = investimento + consumo
Se assumirmos que os trabalhadores gastam os seus salários no consumo e os capitalistas investem todos os seus lucros, obtemos imediatamente:
Lucros = Investimento
De acordo com a teoria PK, é o investimento que gera o lucro – e não, ressalte-se, o contrário. Como diz Alex, é a “demanda esperada” que impulsiona o investimento; o investimento, em sequência, impulsiona os salários e os lucros.
Michel Kalecki, cuja equação fundamental também é esta, disse isso de outro modo: “os trabalhadores gastam [ou consomem] o que ganham [ou seja, os salários] e os capitalistas ganham (a saber, os lucros) o que gastam (ou seja, em investimento)”.
Em minha opinião, esta é uma visão totalmente errada da economia capitalista. Em vez de o investimento impulsionar os lucros, como afirmado acima, a realidade é que os lucros impulsionam o investimento. Portanto, o investimento capitalista não resulta do nível de demanda esperado. Não advém de uma visão psicológica completamente subjetiva dos investidores associada ao que Keynes chamou de “animal spirits”, mas resultam de uma medida objetiva ligada ao investimento anterior, qual seja ela, a lucratividade. Mas, tal como acontece com Keynes, os teóricos pós-keynesianos não querem colocar o lucro em primeiro lugar, mas desejam reduzi-lo a uma consequência de investimento (na verdade, ocultando-o inteiramente da análise). Para mais informações, leia-se o excelente capítulo de José Tápia no livro World in Crisis, editado por Carchedi e Roberts.
[NT]: Os keynesianos em geral aceitam que o investimento depende da lucratividade futura dos projetos disponíveis, mas costumam pressupor que está condição está automaticamente estabelecida, ou seja, que o investimento está garantido se houver demanda suficiente. Por causa desse suposto, se sentem autorizados a passar a discutir a demanda efetiva esperada.
Alex se refere ao trabalho de Hyman Minsky, um teórico do PK que confiou muito nas “expectativas” para explicar as decisões de investimento. “Hyman Minsky discute essa questão longamente: se você acha que o preço de um ativo vai disparar, comece a comprá-lo para obter lucro. Você pode até pedir dinheiro emprestado com base nele, usando esse dinheiro para comprar mais. À medida que o preço sobe, também aumenta a quantidade que você pode pedir emprestado – eis que o preço começa a voar. Todo o episódio do escândalo do Gamestop no mês passado foi uma versão disso: usavam-se opções de compra em vez de empréstimos de margem, mas o princípio é semelhante. O problema surge para Minsky quando os empréstimos são cortados: não há então mais como sustentar os preços e tudo desmorona. Às vezes, as operações orientadas por expectativas extremas podem criar uma loucura nos mercados financeiros, o que pode ter consequências terríveis para a economia em geral”.
Assim, de acordo com Alex (e Minsky), as “expectativas extremas” criam uma “loucura nos mercados financeiros” e isto faz com que toda a economia entre em crise profunda, tal como ocorreu com o colapso financeiro global de 2008. Mas por que tudo desaba depois de ter corrido tão bem graças a tais “expectativas extremas”? Ora, falar em “expectativas extremas” é uma alegação que apenas levanta a questão de por que as expectativas são boas em um ponto do tempo e se tornam “extremas” em outro. O que as tornam extremas?
Os seguidores de Minsk sem dúvida citarão então a sua famosa frase de que “estabilidade gera instabilidade”. Mas, novamente, esta é apenas uma frase inteligente para cobrir o fato de que a concepção PK não tem uma teoria das crises financeiras, exceto que elas acontecem quando as coisas ficam “extremas”.
Em minha opinião, a teoria econômica marxista tem uma resposta bem melhor. Baseia-se em uma visão objetiva das leis do movimento do capitalismo, especificamente das mudanças na lucratividade do capital produtivo (aquele que é gerador de valor). Se a lucratividade é baixa nos setores produtivos, os capitalistas tentam se opor a isso de várias maneiras, uma das quais é investir no que Marx chamou de capital fictício. Mas os ganhos financeiros ainda dependem da lucratividade dos setores produtivos e se a lucratividade cair a ponto de cair a massa de lucros ou o valor adicionado (ou seja, os salários mais os lucros brutos), ocorre uma crise no setor produtivo que se espalha para o setor financeiro.
Eu e outros estudiosos marxistas fornecemos muitas evidências empíricas para explicar as recessões e, em particular, para explicar o colapso financeiro global e a subsequente “grande recessão” que a ele se seguiu. Não o tratamos como um “momento Minsky” em que a estabilidade financeira repentinamente se transforma em instabilidade, mas como um “momento Marx”: aquele em que os lucros caem a ponto de desvalorizar os meios de produção, inclusive os ativos fictícios, assim como a própria força de trabalho
Na verdade, como mostrou Guilhermo Carchedi (ver gráfico abaixo), quando tanto os lucros financeiros quanto o lucro dos setores produtivos começam a cair, uma recessão econômica é desencadeada. Ora, essa é uma evidência que se mostra nas recessões do pós-guerra na América. Contudo, uma crise financeira por si só (medida pela queda dos lucros financeiros) não produz uma recessão se os lucros do setor produtivo continuarem crescendo. Ver sobre isso, o capítulo escrito por Carchedi no livro World in Crisis.

No entanto, Alex Williams defende continuamente a visão do PK segundo a qual “a demanda cria oferta, impulsionando o investimento. Portanto, o investimento cria tanto a poupança quanto o estoque de capital e este último, por sua vez, cria novos recursos produtivos.” Vê-se, novamente, que não há explicação sobre um fato crucial: por que a demanda desacelera ou cai, por que ocorre um colapso do investimento? “É o consumo, e não a poupança, que impulsiona o investimento e ajuda a sociedade a se preparar para o futuro” – diz Alex. Mas a evidência empírica é exatamente o oposto. Em quase todas as recessões nos Estados Unidos ocorridas desde 1945, o investimento caiu antes, enquanto o consumo quase não diminuiu. De modo decisivo, foi a queda dos lucros que produziu a queda do investimento; foi a sua subida que levou à saída das recessões – e não o contrário.

Alex cita, então, o autor da Teoria Geral: “Keynes, como é bem conhecido, menciona em seu livro a Fábula das Abelhas: de modo sumário, diz que a fábula conta a história de uma comunidade que proscreve o luxo e fica muito mais pobre porque todos os que trabalhavam na produção de luxo ficam sem trabalho”. Ora, esse é um argumento absurdo feito por Keynes. Antes dele, no início do século XIX, o pároco reacionário Thomas Malthus também disse que sem o gasto das pessoas ricas haveria “falta de demanda”, de tal modo que as economias entrariam em depressão. São palavras tranquilizadoras se ouvidas pelos bilionários donos das FAANG. São, ademais, empiricamente incorretas, uma vez que muitos estudos mostram que os ricos tendem a economizar mais do que os pobres, como fizeram durante a crise da COVID.
De acordo com Alex, o que há de errado com as teorias alternativas de crises é que elas assumem que o investimento deve vir da poupança e que, portanto, o consumo deve ser reduzido para permitir o investimento. “Na versão ricardiana, ainda hoje usada por marxistas e austríacos, o principal fundo para investimento vem da poupança. O pressuposto é que a economia opera em sua capacidade máxima e que tudo o que não for consumido em um determinado período seja economizado. Para investir, a poupança deve vir primeiro, portanto, ipso facto, o consumo deve ser reduzido para aumentar o investimento”.
Alex acredita que Keynes destruiu essa visão com sua ideia do paradoxo da parcimônia. “Se todos tentam aumentar a sua taxa de poupança, isso significa que estarão reduzindo sua taxa de consumo. Se sua taxa de consumo diminui, a renda das pessoas que vendem para consumir diminui. O problema é que a produção total é determinada pelo consumo e pelo investimento. Se o investimento permanecer constante e o consumo cair, a produção total cai. A taxa de poupança sobe, mas apenas porque agora todos estão economizando a mesma quantia em dinheiro com uma renda menor”.
Como diz Alex, o pós-keynesiano Kalecki “vê a mesma ideia do lado das empresas – e não do lado das famílias. Se os empregadores minimizam os custos minimizando os salários como um todo, eles acabam canibalizando a base de consumo da economia como um todo, afetando os lucros. Se você seguir o outro caminho e deixar os salários subirem, a taxa de lucro aumentará ao mesmo tempo”.
Há dois pontos aqui. A escola austríaca pode acreditar que a poupança é necessária para o investimento, mas não a teoria econômica marxista. Não é a “poupança” que é necessária para o investimento, mas lucros, ou seja, as poupanças feitos pelos capitalistas. A poupança das famílias não é necessária para iniciar o processo de acumulação capitalista. O que se segue é que o lucro crescido eleva o investimento que, por sua vez, eleva o emprego, a renda e, em última instância, o consumo; ou seja, tem-se o oposto da visão PK. Qual delas é correta? Ora, as evidências já foram apresentadas.
[NT]: O autor não discute aqui o papel do crédito no impulso do investimento, mas este, que o alavanca nos períodos de boom, também não acontece se a taxa de lucro estiver caindo ou se ela estiver num nível muito baixo, sem esperança de recuperação. O Estado, por meio do gasto público, pode às vezes dar um estímulo inicial.
Na verdade, não há tanto um “paradoxo da parcimônia” ao estilo keynesiano, mas sim um “paradoxo da lucratividade”. Pois, à medida que os capitalistas se esforçam para aumentar a lucratividade de suas empresas por meio da redução dos investimentos em meios de produção e força de trabalho, podem reduzir na verdade a lucratividade geral da economia capitalista, causando, eventualmente, uma crise.
O segundo ponto é que a teoria de Kalecki aporta uma visão eclética das crises. Elas, às vezes, são “acionadas pelos salários”, isto é, quando os salários e o consumo são muito baixos para sustentar o crescimento, mas outras vezes elas são “acionadas pelos lucros”, ou seja, quando os salários são muito altos e os rendimentos muito baixos para sustentar o crescimento. Porém, nenhuma dessas duas causas podem ser descobertas. Eis que não provê uma teoria coerente das causas das crises regulares e recorrentes que acontecem a cada oito ou dez anos, pois às vezes tem-se uma das respostas e às vezes a outra.
Isso me leva a pensar sobre a política econômica da corrente PK, ainda de acordo com Alex. Ele não vê necessidade de acabar com o sistema de mercado de produção e investimento. Em vez disso, vê como imperativa a regulação feita pelo Estado com o objetivo de regular e neutralizar as falhas e desigualdades da economia capitalista. Como diz o próprio Alex: “trata-se de uma elaboração da posição de John Kenneth Galbraith, segundo a qual o Estado deve se constituir como um “poder compensatório” em relação ao poder das empresas no mercado. Se os governantes não gostam do impacto social vindo do modo como os atores privados governam os mercados, eles são mais ou menos capazes de intervir para mudar as coisas. É impossível dizer que isso não é legítimo, porque o Estado é um dos muitos atores no mercado; ademais, também não é particularmente radical dizer que isso é legítimo”.
Sim, certamente, isso não é muito radical.
Para Alex e o PK, “um mercado é apenas uma tecnologia administrativa que fornece aos atores um lugar para se coordenarem. Um preço é apenas um dos muitos sinais que obtêm em um mercado que funciona bem”. O que é isso: um mercado que “funciona bem”? É difícil supor que este devesse ser o ponto de vista do PK, certo? Ora, talvez seja isso mesmo.
Alex continua sua explicação jogando fora a teoria da classes que subsistem no capitalismo moderno: “A ideia de que há uma lógica global para todas as estruturas de governança dos mercados contingentes (…) acaba condenando a maioria das análises convencionais, mas também a maioria marxista análises. Não existe uma “lógica” subjacente unificada do capitalismo. Ele está constituído por uma série de estruturas de governança interativas e concorrentes. Nenhum comportamento individual ou de grupo é realmente consistente com o comportamento estrutural emergente”.
Alex quer descartar a ideia marxista de que existem estruturas sociais específicas aos diferentes modos de produção, assim como classes que são postas como base nesses modos e em suas estruturas. Para ele, economia não é economia política, mas sim base teórica de “tecnologia administrativa” que visa fazer o capitalismo funcionar para todos.
Quando se chega ao final dessa análise teórica, também se termina na mesma visão em prol do capitalismo do “keynesianismo bastardo” ou mesmo da economia neoclássica dominante. O objetivo da política econômica do pós-keynesianismo é regular o sistema capitalista e usar o Estado para “compensar” as suas falhas a fim de produzir um “mercado que funcione melhor”. Mas mesmo Alex Williams tem que admitir, ao final de sua apresentação dos “princípios” do PK, que “nenhum sistema regulatório é realmente o último, pois as falhas do capitalismo nunca realmente são resolvidas, de tal modo que o objetivo consiste em passar para a próxima dificuldade.” Com efeito.
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